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“Não posso colocar essa palavra feminismo porque eu acho muito forte”: discurso e linguagem avaliativa sobre feminismo em narrativas de gênero produzidas por acadêmicas cabo-verdianas

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Pages 109-138 | Published online: 12 May 2020
 

RESUMO

Este artigo apresenta uma investigação sobre narrativas de gênero produzidas por um grupo de acadêmicas cabo-verdianas, focando nas suas perspectivas acerca dos discursos recentes sobre feminismo. Ao nível analítico lexical, a análise das narrativas teve como suporte o Sistema de Avaliatividade. Ao nível analítico interpretativo, as representações das narradoras foram analisadas e acordo com a abordagem de Fairclough em conjuntos de conceitos de Estudos feministas. Os resultados apontam que o termo gênero foi usado como sinônimo de equilíbrio entre os sexos. Esta perspectiva permitiu que as narradoras se posicionassem no sentido de que as relações desiguais de gênero afetam ambos os gêneros, mesmo tendo conhecimento que historicamente as condições de vida mulheres foram construídas em de desvantagem em relação aos homens. O pouco uso dos termos feminista/feminismo foi atrelado a significados atributivos e avaliativos que os representavam como ‘muito fortes’. Neste sentido, estes termos parecem se referir a uma agenda excludente que diz respeito apenas às necessidades das mulheres. Em conclusão, as avaliações das participantes sobre as categorias gênero e feminismo expressam a complexidade de suas experiências locais, que algumas vezes são representadas como contraditórias.

Disclosure statement

No potential conflict of interest was reported by the author(s).

Notes

1 ‘Não posso colocar essa palavra feminismo porque eu acho muito forte.’

2 Although five researchers were interviewed, only passages from four narratives are used in this article, taking into account the relevance of these passages to support and answer the article’s purposes. The names used are fictional.

3 Original passage:

Eu, quando eu falo de feminismo, quando digo que eu defendo o feminismo, é precisamente … eu vejo que é uma atitude, é uma estratégia, não é? Um caminho para mostrar às mulheres, não é, que elas devem ter, que elas podem ter as mesmas oportunidades que os homens, que elas devem estar cientes dessa questão, não é?

4 ‘[…] elas devem ter, que elas podem ter as mesmas oportunidades que os homens, que elas devem estar cientes dessa questão, não é?’

5 ‘Às vezes eu acho que as pessoas falam do feminismo, pensam em opressão, não é? Eu vejo como liberdade.’

6 ‘Então eu vejo a questão do feminismo nessa perspectiva de buscar o equilíbrio no sentido, por exemplo, aonde há fosso, tentar superar esse fosso.’

7 Original passage:

Nós estamos numa sociedade que ainda temos que trabalhar muito a questão de gênero, porque ainda temos homens ainda com uma mentalidade de que não deveria ter a igualdade de gênero, que deveria continuar a ter sempre a supremacia dos homens em relação à mulher, então eu sempre … só que a minha opinião, não sinto vergonha de dizer o que eu penso, não sinto. Eu falo de uma forma a tentar respeitar a opinião dos outros, ok? Eu tento fazer a sensibilização ao ponto de ver se as pessoas vejam as coisas de uma forma diferente, que não é bem assim. Mas também temos que entender que nós não vamos mudar a mentalidade de uma hora pra outra.

8 Original passage:

Eu inicialmente, quando eu ouvia falar da questão do feminismo, eu via, eu sentia que eram movimentos a favor da mulher, mas hoje em dia eu me sinto feminista sem estar inserida em nenhum grupo, mas também aquilo o quanto que eu me sinto como mulher. Não é? Meu papel como mulher na sociedade, não é?

9 Original passage:

Mesmo eu sinto que nós, as mulheres … não posso colocar essa palavra feminismo porque eu acho muito forte, né? Quando fala-se feminismo eu sinto assim como se fosse um extremo, não? Eu me sinto mulher, na minha totalidade, não é? Na totalidade … então como mãe, mesmo sendo profissional eu consigo conciliar o facto de ser mãe solteira e ser profissional tranquilamente, não tenho problema nenhum.

10 Original passage: ‘

E eu acho que o feminismo nos ajuda muito … as teorias feministas em saber diferenciar as duas coisas: o machismo e o feminismo, porque ao pautarmos pelo feminismo, nós também temos que saber que os homens também têm que entender essa parte, não só de entender a parte machista deles [risos], mas também não temos que ser também feminista ao extremo só por ter essa teoria, colocar em prática e colocar a nossa liberdade em risco. Porque nós vamos fazer só porque está na moda? Não, eu faço isso porque eu me sinto bem, me sinto como uma mulher e eu acho que devo fazer isso e eu me sinto bem ao fazer isso.

11 (a)‘Género’: Representação social do sexo biológico, determinada pelas ideias das tarefas, funções e papéis atribuídos às mulheres e aos homens na sociedade e na vida pública e privada bem como da relação que se desenvolve entre eles; ‘Igualdade de género’: Igualdade, nos termos constitucionalmente consagrados, entre homens e mulheres, reconhecendo a ambos iguais direitos e deveres, implicando igual visibilidade, empoderamento e participação de ambos os sexos em todas as esferas da vida pública e privada. ‘Violência baseada no género’: todas as manifestações de violência física ou psicológica, quer se traduzam em ofensas à integridade física, à liberdade sexual, ou em coacção, ameaça, privação de liberdade ou assédio, assentes na construção de relações de poder desiguais, designadamente pelo ascendente económico, social, cultural ou qualquer outro, do agressor relativamente ao ofendido, considerando-se para o efeito: …

12 Original passage:

Então eu vejo a questão do feminismo nessa perspectiva de buscar o equilíbrio no sentido-, por exemplo, aonde há fosso, tentar superar esse fosso. Por exemplo aqui no caso de Cabo Verde. No domínio da educação pelo menos que havia uma discrepância muito grande em desfavor das mulheres. Mas hoje as mulheres estão a superar os homens sobretudo. A partir do ensino secundário temos mais mulheres permanecem, no ensino superior temos mais mulheres que permanecem, terminam a formação enquanto os homens acabam por ficar pelo caminho, então quer dizer que aqui há um problema em desfavor dos homens.

13 Original passage:

Celia:

Então, nesse momento, inclusive, eu lembro quando fui apresentar o meu projeto de doutoramento – no final das aulas, você tem que apresentar o projeto de pesquisa – eu acho que no Brasil se chama de

Interviewer:

Defesa do projeto?

Celia:

Quando no meio, você vai … 

Interviewer:

Qualificação.

Celia:

Sim. É. Então, eu lembro, depois, me chamaram atenção. ‘Ah, nós não temos nada contra teorias feministas no sul, nem da África, nem do Brasil. Mas também seria bom citar algumas européias, não é?’ Porque houve também, eu sinto que houve esse corte.

14 The original title in Portuguese is As Ciências Sociais em Cabo Verde – Temáticas, Abordagens e Perspectivas Teóricas,

15 The global South represents metaphorically marginalized regions and countries, mostly in the geographical South (Africa, Latin America and Asia).

16 Embora cinco pesquisadoras tenham sido entrevistadas, apenas passagens de quatro narrativas são usadas neste artigo, levando em consideração a relevância dessas passagens para apoiar e responder aos propósitos do artigo. Os nomes usados ⁣⁣são fictícios.

Additional information

Notes on contributors

Litiane Barbosa Macedo

Litiane Barbosa Macedo possui graduação em Letras Inglês (2010), mestrado (2014) e doutorado (2018) em Estudos Linguisticos. É atualmente professora de inglês na Universidade Federal do Piauí, Brasil. Atua como pesquisadora nos seguintes temas: Análise Critica do Discurso; Gramática Sistêmica Funcional; Estudos da Linguagem, Gênero e Representações em diversos modos semióticos; Estudos de Gênero em contextos africanos.

Débora de Carvalho Figueiredo

Débora de Carvalho Figueiredo possui graduação em Direito (1990), mestrado (1996) e doutorado (2000) em Estudos Linguísticos. Atua como professora de inglês na Universidade Federal de Santa Catarina Brasil. Tem artigos publicados em periódicos e livros, como Language and Law/Linguagem e Direito, Vol. 1(1), 2014 (Universidade do Porto), Systemic Functional Linguistics and Critical Discourse Analysis (London: Continuum, 2004), Language in the Legal Process (London: Palgrave Publishers, 2002), e Genre in a changing world (Fort Collins: The WAC Clearinghouse/Parlor Press, 2009). Seus interesses de pesquisa incluem questões de gênero, poder, identidade e corpo em discursos midiáticos e jurídicos.

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